quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Capitulo 01 - Pequeno Girassol

"Lembro-me até hoje daquela belezinha!" - Ria o velho Leo, entre um pigarro e outro, recostado em sua cadeira de balanço. " Se ela não fosse tão novinha poderia jurar que estava apaixonado por ela... Opa! não me interprete mal, mas, sabe como é, aqueles cabelinhos dourados deixavam todos sem folego..." - falava, enquanto coçava o longo queixo grisalho, e baforava aquela fumaça azulada e fedida de seu cachimbo de madeira.

Leo, ou Leonard, era o típico fazendeiro abandonado: abandonado pela mulher, por morte, e pelos filhos, já crescidos. A tecnologia nunca chegou á sua velha casa de madeira, que segundo ele, dando um murro no peito -" já sobreviveu a 5 tornados e muitas enchentes!". Apesar de todos sabermos que naquela área não chovia tanto, e que mesmo assim não haveria porque alagar já era um lugar alto, no topo do vale.
O velho fazendeiro não chegou a me contar, acho que ele não haveria de contar a ninguem, talvez por falta de coragem, talvez por ser muito bobo um velho como ele sentir o que sentiu. Mas o que se sabe, através da vizinhança, foi que tudo começou á tempos atrás, quando, no terreno vizinho, se mudou uma família de americanos para a região (ou pelo menos pareciam americanos, apesar de que depois de tanto tempo, ninguem da vizinhança conseguisse se lembrar). Uma familia feliz, numa pequena casa de cerca branca (Disso todos se lembraravam!): Um homem, uma mulher e uma bela filha de mais ou menos 10 anos, ao que parecia.

Os comentários eram unânimes: A tal menina era a visão de um anjo descido do paraiso: possuia belos olhos verdes, a cor de seus cabelos eram dourados feito trigo e possuia um sorriso raro, mas daqueles que valia a pena esperar. "Lia Keen"- e o nome lhes vinha a cabeça de todos, com um pesar que eu não entendia, uma tristeza de não ver mais a garotinha, que se mudou passados alguns meses por motivos deaconhecidos até pelas fofoqueiras da região.

Eu estava desesperançoso, pois daquela história não havia conseguido arrancar mais nada, então, certa noite fui surpreendido por uma carta escrita pelo próprio Leonard, deixada por ele embaixo da porta do meu quarto numa pousada velha, como toda a cidade, em que estava hospedado havia alguns dias:

"Nunca fui muito bom em escrever cartas e perdoe-me se cometer algum erro, mas tento-me fazer o mais compreensivel dos escritores no momento. Lia keen. Certamente já deve ter ouvido este nome na boca do povo... O sol que se apagou daqui, da vila. A criaturinha mais apaixonante na qual eu tive o prazer, acima de todos, de conhecer e amar. Naquela época minha esposa ainda estava viva, porém muito doente, sempre repousando no seu próprio quarto, e as nossas crianças viviam por entre as casas da vila, correndo e brincando. Eu vivia, como pode ver até hoje, só, em minha cadeira de balanço, esperando por alguma novidade excitante.
Quando a vi pela primeira vez tive um sobressalto, era tão bonita que queria toca-la! Um pequeno girassol, como a chamava em meu consciente. Passava horas me imaginando passeando com ela, brincando e voltando a ser criança, só para estar ao seu lado. Ninguém suspeitou meus sentimentos... Ora! um velho frustrado como eu, solitário, apenas estava feliz por viver de novo a minha infância! Mas na verdade eu estava apaixonado, loucamente amando aquela criança. Eu queria abraça-la e viver com ela para sempre.
Por fim, a familia se mudou da casa passado o verão. A última lembrança que tive da minha pequena girassol, foi o beijo doce e úmido que ela me deu: Já estava entardecendo quando nos sentamos embaixo de uma árvore muito grande, quem nem me recordo mais qual era. A minha boca amoleceu, meus lábios estremeceram e minhas pernas tremiam tanto, que se eu estivesse em pé, teria caído! Mas eu não me movia, eu não conseguia acreditar! Nunca esquecerei o que ela me disse ao pé do ouvido: " Eu acho que sempre devemos experimentar o que nós temos vontade de conhecer... Minha mãe que me disse." - E saiu correndo para a casa, deixando um rastro de confusão que, se não fosse a minha fraca memória, definitivamente não estaria curado."


"Lia keen"- pensei rindo sozinho - "Minha diabinha... Eu vou te encontrar menina...ah se vou! Vou te ver, e veremos se você se lembra de mim" - falava enquanto fechava a minha mala, pronto para embarcar de volta para casa e depois, enfim, quantas cidades forem necessárias para encontra-la.

Prefácio

Lia keen sempre foi considerada um presente.
Uma dádiva para os olhares alheios, os descrentes de beleza, uma florzinha de campo no meio do árido deserto. Era uma menininha faceira, que sorria quando desejava e que também sabia morder, apesar de não ser lá do seu feitio. Loirinha de franjinha. Ah! Que visão adorável quando corria na chuva, quando atirava pequenos pedregulhos, embaçando sua mais divina e pura imagem, no lago.

Alguns acreditam que os lagos e rios são os espelhos das almas, não como uma passagem (ainda custo a crer que acreditem que algo tão material e sólido como um espelho poderia ser transponível!), mas como um reflexo do que você realmente é por dentro. E Lia keen definitivamente não era a calmaria do lago, nem a rocha que agita as águas. Ela é a mão, o ato, a vontade da mudança. É inquietude na sua forma mais singela, uma criança.

Gostaria de propor que analisassemos tal personagem como um fenômeno, quem sabe uma febre alta. Uma situação talvez até previsivel, mas inevitável. Uma febre que provoca delírios, arrepios, calor e suor (até lembra o amor em seus sintomas, porém, seria algo menos etéreo que este). Sua sensação pode nascer em um jovem, uma senhora, um ator decadente ou até numa freira! Situação desconfortável, veja bem, mas tão comum quanto a gripe.

Ah! Lia keen, ainda me arrepia lembrar de teus olhos brilhantes, olhos de gato que procura a caça, gira, disfarça, para então dar o bote. De uma forma tão delicada que até suas vitimas se deleitam com o acontecido.



Vamos começar a história de sua vida, e ao fim disso, veremos se a amamos... Ou a amamos.